Além da Beleza: O Retrato de Uma Mulher Inteira
Uma crônica sobre ser vista, ser mal interpretada, e nunca deixar de ser verdadeira.
Introdução Durante décadas, ouvi que era bonita. Todos os dias, até os meus 60 e poucos anos, essa frase me acompanhava como uma sombra luminosa. Mas o que poucos sabiam — e menos ainda se deram ao trabalho de descobrir — é que por trás da aparência havia uma alma inquieta, uma mente afiada, uma mulher que jamais se contentaria em ser apenas admirada. Esta é a história dessa mulher. A minha história.
Retrato de uma mulher que nunca foi só o que se via
Ela nasceu com olhos grandes, boca pequena, cabelos lisos e uma delicadeza que fazia o mundo parar. Desde cedo, ouviu que era linda. E continuou ouvindo — por décadas, todos os dias. Mas o que ninguém sabia é que, por trás da beleza, havia uma alma inquieta, uma mente afiada, uma mulher que jamais se contentaria em ser apenas admirada.
Ela cresceu em meio a brigas, aos seis ou sete anos já sabia que o amor podia ser barulhento e confuso. Aprendeu a observar, a decifrar silêncios, a ler entonações. Tornou-se uma especialista em perceber o que não era dito. E isso a isolou. Virou uma bolha. Uma lente. Uma proteção.
Mas ela não se calou. Quando não a enxergavam por dentro, ela provocava. Usava o sarcasmo como bisturi, a rebeldia como megafone. Queria espaço para mostrar sua bagagem — feita de estudo, de fé, de dor, de arte, de coragem. E conseguiu. Às vezes com choque. Às vezes com ternura.
Foi mal interpretada muitas vezes. Por ser bonita. Por ser livre. Por rir alto. Por brincar com o mundo como quem sabe que a vida é breve demais para se levar tão a sério. Mas ela nunca deixou de ser ela. Nunca se moldou ao que esperavam. Nunca se apagou.
Dois homens a viram por inteiro. Dois amores que souberam atravessar a superfície e tocar a alma. E isso bastou. Porque ela não precisava de muitos — só de verdade.
Hoje, aos 75, ela alimenta gatos, cozinha com afeto, e carrega uma história que daria um livro. Ou uma revolução. Ou uma oração.
Ela é feita de luz e sombra. De beleza e profundidade. De riso e resistência. Ela é feita de tudo o que não cabe numa primeira impressão.
Epílogo: A mulher no fio
Se eu pudesse me descrever com uma imagem, seria assim:
Uma mulher de cabelos grisalhos, longos e livres, vestida com uma túnica indiana esvoaçante, caminhando descalça sobre o fio de um arame estendido entre os prédios altos de uma cidade. Lá embaixo, o mundo segue apressado, distraído, ruidoso. Mas aqui em cima, eu me equilibro — com os braços abertos, o vento tocando minha pele, o coração firme.
Não é sobre risco. É sobre escolha. Não é sobre medo. É sobre coragem. Não é sobre aparência. É sobre essência.
Essa sou eu. E quem tiver olhos para ver — verá.