sexta-feira, 21 de abril de 2017

Meu Tuiuiu


Meu Tuiuiú

Esther Crouch (Mucha), 2005

Ah… quando eu era menina, queria muito ter um passarinho.
Um pássaro. Um bichinho.

Conforme fui crescendo, fui ficando mais ambiciosa:
queria mesmo um belo pássaro — grande, se possível fosse.

Um dia, ganhei uma ave que, ao nascer, era bem sem atrativos.
Como toda ave ao nascer.

Cuidei dela, alimentei, limpei, brinquei, ensinei coisas.
Para mim, ela era a mais linda desse mundo —
afinal, era a minha ave.

Folheando livros de pássaros, um dia encontrei uma fotografia
de um quase adolescente…
E descobri que era um Tuiuiú —
igualzinho ao que HaShem tinha me dado pra criar.

Bem! Agora meu bichinho de asas já tinha um nome:
Tuiuiú.

Fui lendo, aprendendo mais sobre ele.
Fiquei toda orgulhosa ao descobrir que essa ave
é a ave-símbolo do Pantanal.

Cuidei, lavei, ensinei a rezar o Shema Israel
antes mesmo de ele aprender a dizer “mamãe”.

Ensinei.
Dei dicas de como pescar pra comer,
de como voar solo,
de como construir a vida com amizades verdadeiras.

Corri muito com ele (pois conto a vocês que meu Tuiuiú era macho).
Matriculei na melhor escola.
Fui buscar. Fui levar.

E mais aulas disso e daquilo.
Comidinha boa, pronta na hora.
As penas sempre limpinhas, brilhantes.

Brinquei com ele,
trouxe amiguinhos para brincar —
e ele foi crescendo.

Ele encheu minha vida de alegria
e meus dias de um sol brilhante e quentinho.

Ah… eu tinha o mais lindo e maravilhoso Tuiuiú.
HaShem foi bom pra mim.
Generoso mesmo.

Um dia, de adolescente, ele passou a Tuiuiú adulto.
Ele já sabia — e podia — sobreviver sem mim:
pescar, voar alto, empoleirar-se no topo das árvores.

Vi o bichinho de asas tornar-se um belo e magnífico pássaro.
Meu Tuiuiú cresceu.

Um dia ele me chamou pra contar
que havia encontrado uma parceira especial para a vida.
Alguém com quem ele iria voar pra longe,
pescar, e ter seus “tuiuiuzinhos”.

Foi assim que entendi:
HaShem nos empresta
por um determinado tempo.

HaShem nos dá a honra de ser responsável:
de cuidar, alimentar,
ensinar a pescar
e a rezar…

Não foi sem lágrimas que compreendi
que o meu Tuiuiú nunca foi “meu”, de fato.

Mas, de fato,
eu o preparei para esse tempo,
para esse voo,
para essa grande aventura.

A maior prova de amor
é ensinar o gosto por essa grande aventura que é a vida.
A maior prova de amor
é deixar que o pássaro voe —
deixando as portas e janelas abertas,
para que possa ir em segurança.

Não retive meu Tuiuiú.
Não tentei segurá-lo quando chegou a hora.

Dei um beijo grande,
apertei-o uma vez mais de encontro ao meu peito,
e abri os braços —
para que ele voasse.

Alto.
Bem alto.

Até que meus olhos,
já não tão bons e jovens,
o perdessem de vista,
lá nas árvores, pelos arredores do céu.

Às vezes olho para esse céu
e tenho saudades do tempo
em que ele era pequeno e frágil,
e dependia de mim para protegê-lo.

Tenho saudade do meu Tuiuiú.

Mas agradeço por ter tido esse tempo com ele.

Tenho saudade…
mas também muito orgulho
do meu Tuiuiú.

E.C.



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